É muito comum ligarmos a palavra feedback ao nosso contexto de trabalho: feedback de chefes, colegas, subordinados. Existe uma gama variada de textos sobre o assunto na internet e, junto à palavra, fazemos associação direta às práticas, como eu mesma já escrevi aqui no blog. Mas o feedback está presente em nossa vida de forma diária e contínua, nas nossas relações familiares, de amizade, comerciais e etc. Quantas vezes ouvimos frases como “seu perfume é doce demais”, “você deu uma engordadinha, hein” ou ainda “não gostei da sua camisa”? Tudo isso não passa de feedback, às vezes misturado com pura opinião. Mas como diferencia-los? Como crescer com essas situações?
Sempre que converso sobre esse assunto com a galera, reforço a minha crença de que feedback é uma cultura, um mindset, e que deve ser incentivado e trabalhado desde a base. Do que adianta treinarmos com excelentes técnicas nossos colaboradores para que eles possam dar feedback de forma eficaz se, muitas vezes, essas mesmas pessoas não estão preparadas para recebe-los, dentro ou fora da empresa? É preciso investir no entendimento do feedback, para que possamos vivenciar novas situações com mais leveza.
Lendo o livro “Obrigado pelo feedback” de Douglas Stone e Sheila Heen, uma passagem no início do terceiro capítulo me chamou atenção: o feedback chega em rótulos. E é baseada nele que irei seguir daqui em diante.
Como podemos definir se um feedback está certo ou errado? A primeira atitude é realmente tentar entender de onde vem aquela avaliação, reconhecimento ou orientação. Parece bastante simples e óbvio, mas a verdade é que, em geral, passamos da fase da compreensão direto para a fase do julgamento.
Feedback em rótulos
Pense numa prateleira de supermercado: nela temos uma série de embalagens com café.
Em todas essas embalagens haverá apenas um rótulo com a seguinte palavra: café. Como consumidores, como podemos avaliar o sabor que mais nos agrada? O valor nutricional, se é mais forte, mais fraco ou descafeinado? Quando você compra um café, compra pelo rótulo ou pelo conteúdo que vem dentro?
Com o feedback é a mesma coisa. Se você chega para um colega de trabalho ou amigo e fala: “você precisa melhorar seu espírito de liderança” ou “seja mais disciplinado” o que você está fornecendo é apenas uma embalagem com o rótulo. Como você quer que essa pessoa saiba o que fazer com ele? Voltando ao exemplo do café, o consumidor saberia se ali o café já está moído ou em grãos? Que precisa de uma ou duas colheres para cada xícara? Certamente não.
Quando você fornece um feedback vago, pode abrir margem para x interpretações. A pessoa pode acatar o seu feedback e mesmo assim não saber o que fazer com ele. Quando existem informações que trazem um real entendimento sobre a mensagem que se quer passar, o interceptor poderá concordar ou não com aquela informação, pois agora ele estará munido de melhores condições para decidir.
Interpretando os rótulos
Quando você emite algum tipo de informação, nem sempre quem a recebe irá interpretá-la da mesma forma. A subjetividade dos rótulos é extremamente recorrente e grande causadora de confusão e, muitas vezes, conflitos. Os rótulos significam uma coisa específica para você, que nem sempre é percebida pelo outro.
“Em nossa mente, temos um filme em alta definição que captura tudo o que queremos dizer com esses rótulos – o mau comportamento, o tom zangado, os hábitos irritantes que temos de tolerar. Quando usamos um rótulo estamos vendo aquele filme, que é dolorosamente claro. É fácil esquecer que quando mencionamos o rótulo a outras pessoas, o filme não vai anexado. O que eles ouvem são palavras vagas. Isso quer dizer que mesmo quando “assimilamos” o feedback, é fácil interpretar mal o significado.” (Stone e Heen)
Identifique os rótulos
Um exercício interessante como interceptor é conseguir identificar os rótulos nessas conversas. Como? Estando verdadeiramente atento numa conversa. Uma vez tive um professor que falava muito “aaahhhnnn” no início das frases, mas eu só notei a partir do momento em que comecei a contar a quantidade de vezes que isso acontecia. O mesmo acontece quando alguém treina aqui na Taller para palestrar: estamos atentos em identificar vícios de linguagem, por exemplo, para ajudar esse colega a se apresentar de uma maneira melhor e transparecer maior confiança. Identificar os rótulos é, portanto, um exercício de atenção.
O segundo passo é não tomar para si a premissa do entendimento. Quando alguém vem até mim e fala “você é boazinha demais” isso pode significar uma série de situações e contextos em que apenas com uma conversa, recheada de perguntas, poderemos alinhar o mindset.
O conteúdo além do rótulo
Quando fornecemos um feedback para alguém não estamos apenas nos baseando em dados pois nós, como humanos, interpretamos cada vivência de maneira pessoal e baseada nas nossas próprias experiências.
Pense na seguinte cena: você e um amigos saem do supermercado. Ele carrega todas as sacolas enquanto você está respondendo mensagens no celular. Você encontra um terceiro amigo que assim que o vê solta um “que péssimo amigo!” Ou ainda “que cara malandro que você é”. Essas afirmações são dados ou interpretação de dados? Esse terceiro amigo sabe que você está com tendinite? Ou ainda que o seu amigo simplesmente se ofereceu para carregar tudo porque não achava aquela uma situação ruim?
Afirmações baseadas em dados, ou seja, específicas, seriam o feedback ideal. Mas não é bem assim a forma como funcionamos, por isso devemos considerar sempre a interpretação.
Ao invés de deduzir algum feedback iremos, então, entendê-lo. Você pode ajudar a parte emissora a ser mais clara e até mesmo ter maior entendimento sobre aquilo que ela espera de você.
Pergunte de onde vem o feedback: baseado em quais fatos ou atitudes você acha isso? O que você consegue ver que eu não vejo?
Pergunte para onde vai esse feedback: qual seu conselho para que eu possa melhorar? Você tem um exemplo de um comportamento que você considere ideal para que eu possa me basear? E de um que você considera ruim?
Consequências e expectativas
Tendo essas informações é hora de pensar o que você vai fazer com elas. E nem sempre essa é uma tarefa fácil. Mas usaremos novamente o método de perguntas. Quantas vezes você já recebeu uma informação, aceitou na hora, e depois ficou pensando: cara eu queria ter dito isso, e isso e mais aquilo para aquela pessoa. O macete é: pergunte.
Como isso vai afetar meu futuro ( na empresa, no relacionamento…)? Como eu devo começar a me aprimorar? Quando será a próxima avaliação?
Aprendendo a discordar
Ok, conversamos sobre o feedback, o emissor me deu diretrizes de melhoria, foi coerente. No entanto, eu ainda não concordo com ele. Isso é ruim? Não!
O mais importante em todo esse processo é que melhoramos nossa forma de comunicação. Aumentamos a confiança entre nossas relações e podemos exercitar a nossa transparência, colocando para fora a forma como pensamos e nos sentimos diante de determinada situação.
O objetivo da conversa, no fim das contas, é de que quem recebe o feedback possa entendê-lo, e que o emissor possa entender as necessidades do receptor. Quanto mais entendimento você tiver do feedback maiores as chances de encontrar algo de útil nele, mesmo que não concorde, ou ainda de saber mais a razão de você estar tentando fazer algo e isso estar sendo visto de outra maneira. Também que, tendo maiores informações, mais fácil você poderá argumentar ao seu favor.
Quanto mais exercitamos as nossas habilidades de ser um melhor receptor, melhor seremos em dar feedback.
O próximo passo é: como manter a dignidade da relação ao dispensar o feedback? Tolerância e empatia devem ter um limite? Bom, acho que isso pode ser assunto para um próximo post 🙂
Até mais!